A banda estadunidense The Reign Of Kindo é um caso curioso de grupo capaz de agradar e transitar entre diferentes públicos e gêneros musicais. Formado em Buffalo, Nova Iorque, em 2006, o conjunto surgiu a partir da dissolução de projetos locais de indie rock locais e rapidamente se destacou por sua fusão sofisticada de jazz, rock progressivo e música experimental. Apesar de não apresentar influências diretas do heavy metal, a banda conquistou grande admiração dentro da comunidade headbanger.
No Brasil, essa versatilidade ficou ainda mais evidente. Em 2015, a banda participou do Overload Music Fest, evento cujo line-up incluía majoritariamente nomes do metal. Já em 2016, realizou uma pequena turnê pelo país, incluindo um show no Manifesto Bar, em São Paulo – local icônico e amplamente reconhecido como um “santuário paulistano do rock e heavy metal”.
Após um hiato de nove anos sem visitas ao Brasil, The Reign Of Kindo retornou ao país no último final de semana para três apresentações: nos dias 21 e 22 em São Paulo, no La Iglesia Borratxeria, e no dia 23 no Rio de Janeiro, no Agyto. Representantes da Hedflow acompanharam a segunda noite da banda no pequeno palco do clube, localizado nos fundos de um estacionamento, e registraram a recepção calorosa do público.
Evento com público variado
Ao chegar ao pequeno La Iglesia, a diversidade do público chamou imediatamente a atenção. Entre os presentes, era possível identificar tanto fãs do cenário alternativo, vestindo camisetas de bandas de indie rock, quanto headbangers trajando estampas de grupos de metal pesado que passaram recentemente por São Paulo, como Left To Die, Haken, Leprous e Russian Circles. O evento atraiu pessoas de cidades vizinhas e até de outros estados, além de um turista inglês que estendeu sua estadia no Brasil especialmente para assistir ao show – segundo ele, a banda raramente se apresenta na Inglaterra ou em outras partes da Europa, e aquela era uma oportunidade única de ver The Reign Of Kindo ao vivo.
Com a casa completamente lotada, às 21h, Rocco Dellaneve (teclados), Jeff Jarvis (baixo), Kendall Lantz (bateria) e Joseph Secchiaroli (vocal e guitarra) subiram ao palco e abriram a noite com ‘City Lights & Traffic Sounds’, seguida por ‘The Moments in Between’ e ‘Symptom of a Stumbling‘. A estrutura intimista do clube proporcionou uma conexão única entre banda e público, resultando em uma energia contagiante desde os primeiros acordes, com todos os presentes cantando em uníssono.
Na sequência, veio a belíssima ‘Nightingale‘, uma faixa de teclados marcantes e refrão convidativo, digna de trilha sonora de um filme romântico ou de novela, ou de se encaixar perfeitamente na programação de rádios como a Alpha FM e Antena 1. Durante uma breve pausa, Joseph comentou que o repertório seria o mesmo da noite anterior, mas afirmou que esperava um show ainda mais intenso, devido tamanha animação dos fãs.
‘Morning Cloud’ trouxe uma excelente combinação entre guitarra, teclado e bateria, enquanto ‘Sing When No One’s Around’ reduziu a instrumentação, permitindo que os holofotes se voltassem para a impressionante voz de Joseph. Logo depois, o talento coletivo da banda brilhou em ‘Hard to Believe’ e ‘Just Wait’ – a primeira destacando uma base instrumental de forte influência jazz, e a segunda, uma verdadeira obra-prima de mais de cinco minutos. Com uma introdução digna do math rock de bandas como Jizue e da pianista japonesa Hiromi Uehara, a música apresentou um ritmo dançante com influências caribenhas e um solo de bateria arrebatador, arrancando aplausos do público.
Após a complexidade das duas faixas anteriores, Jeff assumiu a responsabilidade de acalmar os ânimos com ‘Blistered Hands’, trazendo uma linha de baixo suave em uma canção de forte apelo pop. Em seguida, ‘Return to Me’ provou ter o potencial de um grande hit, com um ritmo dançante que remete ao groove sofisticado de Jamiroquai.
Encantado com a reação efusiva dos fãs, Joseph fez elogios ao público, que respondeu à altura durante ‘Great Blue Sea‘, protagonizando um dos sing-alongs mais bonitos da noite. Na sequência, ‘Thrill of the Fall’ e ‘Now We’ve Made Our Ascent‘ permitiram que o virtuosismo dos músicos brilhasse novamente, com influências evidentes de música progressiva e math rock. Logo depois, os integrantes deixaram o palco, abrindo espaço para uma performance emocionante de Joey, que interpretou sozinho ‘One Man Parade’, criando um momento intimista e cativante.
Com a banda de volta ao palco, o show entrou em sua reta final com uma sequência arrebatadora: ‘Till We Make Our Ascent’, ‘Smell of a Rose’, ‘The Hero, the Saint, the Tyrant, & the Terrorist’ e ‘Human Convention’. O set ainda contou com um medley surpreendente que mesclou o hit ‘Let It Go’ com trechos de ‘Something In The Way That You Are’, ‘Careless Whisper’ e outras canções. Nesse momento, o público cantou tão alto quanto o vocalista, tornando o encerramento ainda mais especial. Emocionado com a recepção calorosa, Joseph prometeu um novo disco em breve, além de um retorno ao Brasil.
Assistir ao The Reign Of Kindo ao vivo deixa evidente o motivo pelo qual a banda conquista públicos tão diversos: os músicos entregam uma performance tecnicamente impecável, aliada a um carisma singular, criando uma atmosfera de bem-estar que torna o show uma experiência única. Trata-se de um grupo musical muito acima da média, que merecia ser ainda mais popular.
Fotos: Tamires Lopes (Credenciada pelo site “Headbangers News”)
Setlist
City Lights & Traffic Sounds
The Moments in Between
Symptom of a Stumbling
Nightingale
Morning Cloud
Sing When No One’s Around
Hard to Believe
Just Wait
Blistered Hands
Return to Me
Bullets in the Air
Great Blue Sea
Thrill of the Fall
Now We’ve Made Our Ascent
One Man Parade
Till We Make Our Ascent
Smell of a Rose
Let It Go / Something In The Way That You Are / Let It Go / Careless Whisper / Something In The Way That You Are / Something
The Hero, the Saint, the Tyrant, & the Terrorist
Human Convention
Texto: Guilherme Góes
Agradecimento Especial: Maria Correia (Heavy Metal Online / Metal No Papel)
