Conhecendo “uma tristeza perfeita” na expo Bjork Digital em São Paulo


“Uma tristeza perfeita. Dessas que te fazem criar algo. Para não duvidar de como se sente. Uma tristeza perfeita”.

Me dei o direito de me apropriar destas palavras escritas por Liniers, um quadrinista argentino, pois somente elas poderiam definir a obra de Bjork.

A exposição Bjork Digital, que se realiza no Museu da Imagem e do Som, em São Paulo, é um convite para conhecer a ferida aberta no peito da multiartista. Com alguns pôsteres lindíssimos e coloridos, que dividem o espaço com salas escuras, é possível entender o conflito de emoções em que ela tem vivido.

O silêncio impera, e toda a experiência é realizada através do mundo digital. Os óculos de realidade virtual e os fones de ouvidos são os nossos meios de transporte. Os pôsteres, apesar de belos e ‘instagramáveis’, não foram feitos para serem registrados por lentes de smartphones. A pedido da própria artista, nada ali deve ser fotografado, apenas vivido e sentido.



A exposição já passou por Tóquio, Barcelona, Cidade do México, Moscou, Montreal, Londres e Los Angeles, e agora está no Brasil.

No primeiro andar, temos acesso às faixas ‘Stonemilker’, ‘Black Lake’, ‘Mouth Mantra’, ‘Quicksand’ e ‘Familye Notget’ do álbum Vulnicura (2015). O disco começou a ser feito enquanto o casamento de Bjork e de seu ex-marido, Matthew Barney, começava a ruir.

O vídeo que somos convidados a ver em realidade virtual é o de Stonemilker, feito 9 meses antes de seu divórcio. A sensação de solidão, desdobramento e, em alguns momentos esperança e desespero, é claramente sentida. Ela aparece toda vestida de amarelo em uma praia cheia de pedras, em um dia úmido e aparentemente frio. Em alguns momentos a sua imagem é duplicada, reforçando a ideia de que, além de tirar leite de pedra, ela se fazia em duas para manter tudo aquilo em pé.

Em Black Lake, tudo é mais forte como uma pancada. Qualquer um que tenha passado por algo parecido consegue sentir na pele a raiva, a dor, a tristeza, o medo, o arrependimento. É extremamente humano!

Bjork aparece com os olhos delineados, dentro de uma caverna onde tudo se despedaça. Os pés descalços e sujos caminham no meio da escuridão, e, finalmente, encontram uma saída daquele lugar. O vídeo é um tanto duro de assistir!

O tempo todo é possível ver que o peito de Bjork é o centro de tudo, é dali que sai a luz que ela precisa, e também foi dali que ela foi retirada.

Em Mouth Mantra todo o projeto foi feito de dentro da boca da artista. A música é sobre uma cirurgia que ela precisou fazer nas cordas vocais, e lá de dentro podemos assisti-la do lado de fora, dançando no escuro. Talvez, naquele momento, a artista possa ter percebido quantos motivos ela ainda tinha para continuar, afinal, a arte é algo que nunca pedirá o divórcio a ela.

A partir daí é possível perceber uma evolução quanto às emoções de Bjork. A ferida torna-se um ponto de luz radiante.

Já em Quicksand, me atrevo a dizer que Bjork permite que todas as emoções explodam e emanem a energia necessária para deixar morrer e deixar viver. E eu diria que sim, ela foi capaz de renascer!

O próximo vídeo é o Family Not to Get, e nesse espaço recebemos um controle onde podemos interagir o tempo todo com a realidade virtual, e a sensação é de realmente dividir espaço com Bjork na pequena sala escura que torna-se um espaço talvez de outro planeta. A luz neon produzida pelo nosso controle começa a fazer parte da obra dela.

Ali, em frente aos nossos olhos, é possível ver que a pequena e frágil Bjork cresce, tornando-se um ser poderoso, que nos dá uma leve sensação de temor e ao mesmo tempo de admiração.

Se a intenção da artista foi que nos sentíssemos em sua pele, fazendo com que nos afastássemos de nossos aparelhos eletrônicos (para entrarmos de cabeça na tecnologia que nos aproxima da ferida aberta em seu coração), digo, sem sombra de dúvidas, que ela conseguiu atingir o seu objetivo.

Torço para que essa ferida se feche, e que ela nunca se esqueça que é no peito de uma mulher que mora toda a luz.



Como lembrança, todos nós ganhamos um cartão informativo sobre a exposição que vira um pôster. Ela fica em cartaz até 18 de agosto no Museu de Imagem e do Som em São Paulo, e a dica é: compre antecipadamente pela internet!


Texto e fotos por Dani Melo

Conhecendo “uma tristeza perfeita” na expo Bjork Digital em São Paulo

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