No ano de 2019 o Ratos de Porão, uma das principais bandas de música extrema do país, tem feito uma série de shows para celebrar os 30 anos do disco BRASIL, considerado por muitos como o melhor do grupo. Isso pode até gerar discussão entre os fãs, pois o que não falta na longeva carreira do RDP são clássicos, mas a importância do álbum na atual cena brasileira é indiscutível.
O lendário Sesc Pompéia foi um dos palcos escolhidos para que João Gordo (vocal), Jão (guitarra e backing vocals), Juninho (baixo e backing vocals) e Boka (bateria) tocassem na íntegra as 18 faixas do disco.
E a verdadeira festa da música underground antifascista também teve a banda Surra como convidada para abrir o evento.
Formado na cidade de Santos, o Surra deixou de ser um grupo promissor para se tornar um dos principais nomes do cenário ‘thrashpunk’ brasileiro. Divulgando seu mais recente lançamento, o full-length‘ Escorrendo pelo Ralo‘, a banda abriu o show apresentando a faixa-título, cantada por boa parte do público que já lotava a comedoria do Sesc Pompéia.
A banda priorizou o repertório do disco novo na primeira parte da performance, tocando uma faixa atrás da outra, sem deixar muito espaço para o público respirar. Mas não faltaram músicas de outros trabalhos, como ‘Peso Morto’, ‘Tamo na Merda’ e ‘Embalado pra Vender’.
Leeo Mesquita (guitarra e vocal), Guilherme Elias (baixo e vocal) e Victor Miranda (bateria) fizeram o público agitar do início ao fim de sua apresentação. Um dos poucos momentos no qual a banda parou foi quando o samba ‘Virou Brasil pt.1’, que no disco é cantado por Guilherme, começou a tocar no sistema de som da casa. Mas foi por pouco tempo, pois o Surra emendou com ‘Virou Brasil pt.2’ e ‘Não Entendi’, transformando o Sesc em um verdadeiro campo de batalha!
Por ter um tempo reduzido de show os membros do Surra discursaram pouco, deixando a música falar por si e demonstrando toda a insatisfação com a atual situação política do país. Para encerrar, Leeo pediu para que os fãs fizessem um circle pit que virasse um vórtex e abduzisse todos presentes!
Não podemos falar que o público não tentou, pois durante ‘Cubathrash’, ‘Parabéns Aos Envolvidos’ e ‘7 a 1’, foram vistas as maiores rodas da noite até então. Com excelente iluminação e som impecável, a banda fez um concerto memorável, aumentando ainda mais a expectativa pela apresentação do Ratos.
Após uma troca de palco muito rápida (as bandas compartilharam a mesma bateria), chegou a hora de ouvir ao vivo as músicas de um disco que, infelizmente, soa mais atual do que há 30 anos.
Em meio a notícias que o desmatamento no Brasil tem aumentado como nunca, a banda começou os trabalhos com ‘Amazônia Nunca Mais’. Fica difícil acreditar que João Gordo acabou de passar por uma preocupante pneumonia. Com o perdão do trocadilho, o vocalista cantou a plenos
pulmões, que estavam cheios de ar, ódio e indignação!
O show, que mais parecia ser uma profecia se cumprindo, seguiu com
‘Retrocesso’, o clássico ‘Aids, Pop, Repressão’ e ‘Lei do Silêncio’.
Com quase 40 anos de história, o RDP parece estar em seu melhor momento ao vivo, sem tirar o pé do acelerador em nenhum instante. Assim também estava o público: incansável, cantando todas as músicas e fazendo uma grande roda que tomava conta de quase toda a pista.
Como em quase toda performance do Ratos, ‘Beber Até Morrer’ foi um dos pontos altos da noite com os fãs promovendo uma verdadeira chuva de cerveja.
A todo momento, Gordo afirmava que precisamos lutar contra o atual governo. Uma referência explícita foi durante ‘Plano Furado II’, onde um dos versos da música foi atualizado para “Ei, Bolsominion! Olhe só o que você fez.”
Assim como no show do Surra, o som estava excelente, com todos instrumentos muito bem equilibrados.
Ouvir as músicas do disco BRASIL ao vivo é ter a certeza que Jão é um dos maiores e mais influentes guitarristas da música pesada no país. Tocou
perfeitamente cada riff e deixou os solos do disco ainda mais viscerais. Um
bom exemplo disso é ‘Crianças Sem Futuro’, com aquela veia Crossover do
final dos anos 80. ‘Farsa Nacionalista’ chegou na sequência com Gordo
dizendo que “ela faz até mais sentido hoje em dia do que a época do lançamento do disco”.
A introdução do baixo de Juninho anuncia ‘Vida Animal’, mais um grande clássico aguardado pelos fãs. Chegando no fim do que seria o lado B do disco, fica claro que BRASIL é um álbum que funciona perfeitamente ao vivo.
Boka conseguiu tocar a virada de bateria de ‘Terra do Carnaval’ de uma forma ainda mais brutal do que a imortalizada por Spaghetti, que era o baterista do Ratos na época da gravação.
‘Herança’ é a música que encerra o disco e que também fez com que a banda saísse do palco ovacionada pela galera, que estava longe de demonstrar cansaço!
Aos gritos de “Ratos, Ratos, Ratos”, o grupo voltou rapidamente para mandar quatro clássicos que estão no primeiro disco completo do RDP.
‘Morrer’, ‘F.M.I.’, a faixa-título ‘Crucificados pelo Sistema’ e ‘Obrigado a
Obedecer’, provam que esses caras sabem como ninguém retratar a
realidade do país em suas composições. Tudo soa muito vivo com músicas
que são mais velhas do que muitos que estavam presenciando um dos
maiores patrimônios musicais do BRASIL!
Texto por Bruno Teixeira
Fotos por Gil Oliveira
SETLIST SURRA
01. Escorrendo Pelo Ralo
02. O Mal Que Habita a Terra
03. Do Lacre ao Lucro
04. Não Escolha
05. Peso Morto
06. Tamo na Merda
07. Embalado pra Vender
08. Anestesia
09. Mais Um Refém
10. Virou Brasil pt.1 (vinheta)
11. Virou Brasil pt.2
12. Não Entendi
13. Caso Isolado
14. Arquitetos da Desgraça
15. Madeira e Sangue
16. Cubathrash
17. Parabéns aos Envolvidos
18. 7 a 1
SETLIST RATOS DE PORÃO
01. Amazônia Nunca Mais
02. Retrocesso
03. Aids, Pop, Repressão
04. Lei do Silêncio
05. S.O.S. País Falido
06. Gil Goma
07. Beber Até Morrer
08. Plano Furado II
09. Heroína Suicida
10. Crianças Sem Futuro
11. Farsa Nacionalista
12. Traidor
13. Porcos Sanguinários
14. Vida Animal
15. O Fim
16. Máquina Militar
17. Terra do Carnaval
18. Herança
BIS
19. Morrer
20. F.M.I.
21. Crucificados pelo Sistema
22. Obrigado a Obedecer”
