Bragança perde-se no frio e na névoa que vivem para lá da Serra do Marão. Bragança é Casa, Bragança é Vida, Bragança é onde vive o Coração. Qual cliché, qual frase feita, Bragança é, efectivamente, onde vive o Coração, mas de onde o Racional escapa, por ser exactamente isso, Racional. É pena, é triste, mas é a realidade, a única realidade que a mesma nos apresenta.
Adoramos ser por ela recebidos. Sabemos que não nos falhará com o que quer que seja… mas não nos aconselha a ficar. “Será difícil, acredita”, como que nos sussurra de cada vez que se coloca a hipótese de, mais uma vez, fixar raízes. Bragança é pouso para todos aqueles que, saturados da imensidão de tudo aquilo que compõe a metrópole, dela fogem, em busca da salvação mental e, em muitos casos, da alma.
Longe, bem longe do resto da civilização, vive uma terra que não precisa daqueles que para baixo da Serra do Marão vivem. Ela, pelos que fisicamente a compõem, crêem que sim, que precisam daqueles que lá não estão, que de lá não são, que para lá nunca rumarão… é triste, que aqueles que deveriam alto hastear a bandeira do “Somos capazes e seremos capazes”, sejam os primeiros a cortar as pernas, os braços e o ânimo a alguns, poucos, que muito querem fazer.
Mas que raio de rumo terá este chorrilho de Velho do Restelo? Desculpem… Velho da Praça da Sé ou, para ser mais correcto, Velho do Largo da Sarzeda. Sim, sim, assim sim! Música… a Música nos traz aqui. Isso, essa coisa, essa actividade que fomenta paixões e nos leva, em dados momentos, às lágrimas. Bragança tem Música. Bragança tem Músicos… então porque raio nunca se ouviu para lá das barreiras – invisíveis – da Serra do Marão? Boa pergunta… Imaginemos, que aqueles quatro putos de bigode de Birmingham desistiam da ideia de fazer Música, só porque não moravam em Londres? Trágico, trágico! Trágico é o facto de Bragança não fazer um pouco mais por si. Ou será que são aqueles que a compõem, que por eles próprios pouco fazem? Sei lá, mas que gostava de saber, gostava.
Há uns meses valentes dei de caras com uma notificação, numa daquelas redes sociais, daquelas que nos viciam e nos prendem de um modo que – guilty – já nem tento perceber, sobre uma nova banda em Bragança. Espera, banda nova em Bragança? Ora lá está algo que há muito não ouvia. Hey, banda de originais! Isso então, era impensável. Fui de cabeça, escutar que tal soava, na esperança de puder voltar a dizer, como no fim dos 90: Bragança tem alma de Música! Fui. Ouvi. Ouvi de novo. Analisei. Analisei de novo. Curti. Rock n’ Roll com um cheiro à ilha da Rainha. Aquela porra cuspia The Stone Roses e punk rock Britânico!
Andei os 90 a ouvir disto até mais não, e chego ao Séc. XXI, a Bragança, e as memórias da pré-adolescência passam-me todas diante dos olhos! Porra! Rock britânico, ya pricks! A coisa era – e ainda é, até ver – fofa!
Raiva Rosa is the name.
Oh well, não fazia ideia alguma que tal se arrastava pelas gastas e desinspiradas ruas da capital transmontana. A coisa tem alma! A coisa tem conteúdo! A coisa sobreviverá à realidade musical da cidade? Bragança vive de bandas de tributo. É pena, é triste. É deveras revoltante que aqueles que criam, se sujeitem a tocar a música de outros! Bem… sujeitar não se será ao termo correcto, mas já nem quero saber os motivos. Sim, este é um “ataque”, mas daqueles fofos, que não tomarás a mal porque não és acéfalo ao ponto de pensar que te “ataco” só porque sim… ou então achas, e aí esquece e nem te chegues perto!
Mas de regresso … Raiva Rosa é uma banda que surge em Bragança, em Setembro de 2018, por 4 nortenhos, saudosistas de um Rock n’ Roll sem rótulos. Influenciados pelos anos dourados do Rock (Led Zeppelin, White Stripes, Ornatos Violeta), cantam em português, pela voz de João Sousa, os poemas escritos um pouco por toda a banda, enquanto os acompanha com a Les Paul rouca e teatraliza gestos que por toda a banda, enquanto os acompanha com a Les Paul rouca e teatraliza gestos que terá vistos repetidos até à exaustão num qualquer palco por esse Mundo fora (hey, Alex Turner, tops eu a olhar para ti).
A seu lado tem André Almeida, que deixa cair riffs fortes e distorcidos à música da banda transmontana, trazendo o ‘punk’ e o ‘stoner’ de que tanto gosta, acompanhado daquele lenço que me remete de imediato para os Xutos (?)… Zé Pedro, estás aqui! No baixo, o toque de Heitor Peixoto é vivo e coerente, sério, postura recta, como que comandando a armada. Complementando a base rítmica, com a bateria básica e descomprometida, Simão Reis. A batida segura, ritmada, simples q.b., mas eficaz até mais não… são estes alguns dos pormenores que fazem destes putos uma filão a explorar, sem dúvida. Há aqui postura, há aqui trejeitos… há aqui Rock n’ Roll! Em Dezembro de 2018 gravam uma maqueta à qual dão o nome da banda. Composta por 5 músicas, há a destacar a música de nome “Raiva Rosa” onde, com um ritmo mais lento e duro, visitamos Black Sabbath e até mesmo Queens of the Stone Age! Blew me away hahaha… É com essas 5 músicas que se apresentam, ainda esse mês, na edição de Dezembro do ‘Para cá do Marão‘.
Depois de correrem todo o (curto) circuito de bares da cidade de Bragança marcam presença na Semana Académica de Bragança de 2019, assim como na edição deste ano do Quintanilha Rock.
O nome. Boy, o nome! Achei logo um ‘piadão’. Quem raio dá este nome a uma banda? Well… se formos por aí, Led Zeppelin, anyone? Mas não vamos, porque tal é totalmente irrelevante para esta dissertação. Mas o nome é bom, caramba! The Stone Roses, só um pequeno exemplo. E o Rock também é feito disto, deste estado ‘descomprometido’. Pois… O som é bom. A postura em palco é Rock n’ Roll: tem tanto de boa como totalmente teatral. Mas esse teatral é giro, pá, é bom, é o que falta a uma cena que está moribunda. Bragança tinha, no início do século, uma imensidão de bandas de originais, de músicos, de pessoal que fazia música só pelo belo prazer de fazer música… mas e depois, que passou afinal para a agulha da bússola se virar para Sul? Não sei, mas juro que gostava de saber e até escreveria uma porcaria similar a esta, só para ilustrar, naquelas redes sociais bonitas e nadinha narcisistas, o porquê da coisa.
Já vos disse para irem ouvir a banda? Vá, vão lá. É fofo, é bom, é refrescante. É diferente? Reinventam a roda? Nada disso, e nem é isso que se quer, muito sinceramente. Rock n’ Roll… cerveja, um espécimen de droga leve, um solo de guitarra e um hino de uma geração… Rock n’ Roll, pffff… E assim se alimentam as almas daqueles que, como eu, salivam quando lhes é dado a assimilar algo que lhes mexe com o sentimento e a emoção, em geral. Não só de Música vive a esfera da Cultura, mas esta é combustível para veículo há muito parado, a ganhar pó e ferrugem. Que mais falta à capital do distrito para crescer? Para ressurgir? Para arrastar almas e cadáveres para as suas entranhas? Novos projectos nascem em Bragança, com o intuito de levar a cabo esse metafórico arrastar… ansiosamente aguardamos, no nosso íntimo bate aquela inveja saudável, mas que se mutará em orgulho caso a realidade por este pessoal idealizado, se concretizar.
Aqui aguardamos, pacientemente, que a capital se transforme na Capital…
Texto por Daniel Pinheiro
Foto por Rui Coelho