A décima quarta edição do LaMigra recebeu como convidada a professora de língua árabe e ativista social da causa palestina, Rawa Al Sagheer. Nascida na Síria, ela chegou ao Brasil em 2015 depois de um período como refugiada na Turquia, atuando como uma representante da diáspora palestiniana pelo mundo (aproximadamente 7 milhões de refugiados). Rawa afirma que todos os palestinos que foram expulsos do seu território entre 1947 e 1948, têm o direito inalienável de retornar à sua terra natal.
Durante a conversa, Al Sagheer relatou as dificuldades que a família passou durante o refúgio da Síria para a Turquia, como a separação forçada dos membros da família e o agravamento da doença de seu pai, que resultou em seu falecimento. Na altura, a Turquia não concedeu um visto que proporcionasse a estadia legal de Rawa no país, o que levou a família à ‘ilegalidade’, impedindo-os de trabalhar e estudar normalmente.
Diante desse quadro, Rawa e os demais refugiados em outros países acabaram por encontrar no Brasil a chance do reagrupamento familiar e da construção de uma vida mais digna. A ativista relatou que teve muitas dificuldades burocráticas e linguísticas ao chegar em solo brasileiro e que demorou um pouco para encontrar trabalho. Hoje, ela dá aulas de árabe e alguns membros da família exercem atividades no setor de serviços.
Rawa chamou a atenção sobre o apoio internacional, afirmando ser “muito restrito” e que a imprensa hegemônica ocidental veicula a situação palestina de uma forma extremamente manipulada e desonesta. Segundo ela, a imprensa dá a entender que grupos extremistas palestinos atacam os próprios cidadãos palestinos por motivos irracionais, e que o estado de Israel serviria como ‘garantidor’ da paz e da ordem ocasional.
“Todo humano pelo mundo tem que pegar a luta palestina como questão dele, porque é uma luta de humanidade mesmo.”
Rawa Al sagheer
Além das mentiras veiculadas pela imprensa tradicional, Rawa alerta para a gravidade da situação também na internet. Redes sociais têm apagado (censurado) posts e relatos de jornalistas e pessoas que trazem informações locais em primeira mão, enquanto aumenta o alcance de posts e reportagens que distorcem a realidade dos fatos.
Muitos ativistas da causa palestina que se encontram espalhados pelo mundo estão sofrendo boicote das redes sociais, tendo seu alcance extremamente reduzido e sem conseguir acesso às informações que antes conseguiam sem muita dificuldade.
Rawa também aponta para a repressão que os atos espalhados pelo mundo em prol da Palestina vêm sofrendo pelas forças policiais (que não atuam da mesma forma em relação aos atos pró-Israel). Neste sentido, Al Sagheer explica que a guerra do povo palestino não se dá somente no território palestino, mas em todos os lugares onde a diáspora palestina se encontra, mencionando ainda a existência do boicote aos produtos israelenses como uma das formas de resistência às ocupações ilegais que ocorrem desde a década de 40.
Durante a live, a entrevistada fez questão de passar um contexto histórico e explicar que, até a década de 20 do século passado, não existia uma delimitação formal entre os estados árabes na região e que, portanto, o Estado palestino então existente não possui fronteiras muito delimitadas com o Líbano, Síria, Jordânia e Egito, permitindo uma livre-circulação de pessoas (não somente árabes) na região.
O colonialismo britânico, apesar de não ser responsável pela existência do movimento sionista (que possui origem no século XIX), promoveu uma ocupação em massa de europeus na região a partir da década de 40, quando a desestabilização recente da Palestina começou a se verificar de maneira mais acentuada. Na altura, a ONU conferiu, oficialmente, 50% do território aos palestinos e 50% aos israelenses. Contudo, hoje em dia, a Organização vem tendo uma atuação deplorável de omissão diante das agressões cometidas por Israel.
A partir de 15 de maio de 1948, Israel começou a estabelecer seus assentamentos sobre 54% do território palestino. Em 1967, os israelenses já ocupavam 78% do território palestino, contando com o apoio irrestrito dos Estados Unidos e Reino Unido para tal.
Rawa lembrou ainda que, no último dia 05 de maio de 2021, Israel comprou 750 milhões de dólares em armas dos Estados Unidos.
Outro resgate feito por Rawa, e que ocorreu na década de 70, foi sobre as chamadas Intifadas palestinas (movimento de resistência palestino), que acabaram pela realização da primeira conferência de paz em 1991 na cidade de Madrid, com a participação da OLP (Organização de Libertação da Palestina), de Israel e demais países mediadores.
Em 1993, ocorreu o acordo de Oslo, no qual a Autoridade Palestina concordou em estabelecer a existência de dois Estados no território (22% para os palestinos e 78% para os israelenses). Mas em 1996, Benjamin Netanyahu começou a descumprir o acordo, promovendo a ocorrência de assentamentos israelenses em territórios palestinos, entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, restringindo brutalmente a circulação de pessoas e bens essenciais na região.
A ativista explicou ainda que os sionistas possuem a prática de omitir e eliminar documentos que comprovam a posse de terras por parte dos palestinos, inclusive imóveis. Mais de 500 pessoas estão sendo desalojadas de suas casas, de forma completamente agressiva e ostensiva por parte das forças policiais israelenses.
Sobre o Hamas, Rawa esclareceu que se trata de um grupo de resistência palestina que constitui um partido político legalizado, e não uma organização terrorista como é veiculado pelos grandes meios de comunicação.
Al Sagheer não deixou de fazer uma ligação entre os governos do Brasil e de Israel ao mencionar que as instituições brasileiras estão ocupadas por uma ideologia sionista israelense, representada na figura do presidente da República, e alerta que esse movimento não se limita à dominação do território palestino, mas tem ambições em escala global. Ela também enfatiza que o termo ‘semita’ é erroneamente utilizado pelos sionistas, já que este se refere, na realidade, a todos os povos semitas, incluindo os próprios árabes.
Por fim, Rawa também destacou que Israel não disponibilizou vacinas para a população da Faixa de Gaza, mesmo sendo um dos países com a maior taxa da vacinação do planeta.
Assista o #LaMigra completo com a participação da Rawa Al Sagheer no link abaixo:
Texto por Felipe Cunha e Stefani Costa
Foto em destaque por Mustafa Hassona (2018)