São Paulo recebe primeira edição do festival Summer Breeze

O impossível tornou-se realidade no último final de semana (29 e 30), quando o Memorial da América Latina, em São Paulo, sediou a tão aguardada estreia do festival Summer Breeze no Brasil.

O evento, um dos mais importantes de música extrema da Europa, trouxe mais de 40 bandas para se apresentarem nos palcos Hot Stage, Ice Stage e Waves Stage, totalizando mais de 20 horas de música ao vivo.

Mas a festividade não se limitou apenas à música, oferecendo também diversas atrações secundárias, como exposições de cultura geek e horror, food trucks, estandes de lojas e sessões dos patrocinadores com ambientes “instagraveis”‘. Além disso, o evento também contou com palestras de figuras renomadas do rock mundial, incluindo Bruce Dickinson e Simone Simons. Para os fãs, não há dúvidas de que o Summer Breeze foi simplesmente a Disneylândia do heavy metal!

– Histórico

O Summer Breeze é um festival de heavy metal que acontece anualmente desde 1997 em Dinkelsbühl, Alemanha. Criado com o objetivo de celebrar o gênero, o evento sempre reúne bandas consagradas e emergentes da cena musical extrema.

Com o passar dos anos, o Summer Breeze passou a ser reconhecido como um dos principais espetáculos de rock da Europa, atraindo fãs de todo o continente e do mundo. Algumas das bandas que já se apresentaram no festival incluem Nightwish, Machine Head, Children of Bodom, Meshuggah e Arch Enemy.

Em 2023, o festival finalmente chegou à América Latina com a primeira edição realizada no Brasil, e os organizadores do evento já anunciaram que a festividade irá acontecer novamente no país em 2024.

– Shows e experiência geral

Os portões abriram pontualmente às 10h para o público geral. Durante a primeira hora, os presentes puderam solicitar lanches e bebidas nos food trucks ou conferir as barracas com merchs exclusivos que apresentavam produtos inéditos das bandas do lineup e outros itens da marca Summer Breeze, bem como estandes dos patrocinadores.

Diferentemente de alguns festivais realizados recentemente no Brasil, a pauta ESG, sigla em inglês para Environmental, Social and Governance (ambiental, social e governança, em português), não teve grande destaque no Summer Breeze. Em vez disso, boa parte dos estandes eram voltados para ambientes fotográficos.

A área da Jack Daniel ‘s exibiu um bar retro com o logo da marca em iluminação LED, enquanto o game Diablo IV montou uma fonte d’água simulando um cenário do jogo, além de cosplays de personagens.

Para os profissionais da imprensa, foi montada uma sala de imprensa na ‘Biblioteca Latino-Americana’, onde puderam aguardar o início dos shows com snacks, bebidas e Wi-Fi gratuito.

Shows

No Palco Sun, o menor cenário do festival, a abertura ficou a cargo do conjunto humorístico Brutal Brega, um projeto paralelo formado por João Gordo, Val Santos, Daniel Giometti, Rogério Wecko e Guilherme Martins, que apresenta releituras em versão punk rock de músicas de figuras como Sidney Magal, Reginaldo Rossi e Ednardo.

Durante o set, o grupo tocou praticamente na íntegra o full length disponibilizado nas redes de streaming, com destaque para os singles ‘Fuscão Preto’, ‘Domingo Feliz’ e ‘Sandra Rosa Madalena’, que foram acompanhados pelo público com grande entusiasmo. Além disso, algumas músicas que não foram incluídas no lançamento também fizeram parte do repertório, como ‘Pavão Misterioso’ e ‘Tropicana’.

A presença de palco de João Gordo acabou sendo uma atração à parte. Em diversos momentos, o vocalista brincou com a plateia, comentando coisas do tipo “Vocês não têm vergonha de cantar essas músicas velhas?” e “Depois não adianta chorar quando tiver vídeos de vocês na internet passando vergonha alheia”. Por mais surreal que pareça, a mistura do instrumental do punk clássico com composições bregas combinou bem. 

No entanto, foi possível perceber que a proposta principal do Brutal Brega era mais ‘fazer graça’ do que destacar algo virtuoso. Ainda assim, a proposta de começar o evento com algo diferente foi bastante assertiva, especialmente considerando que a banda é composta por figuras importantes do cenário metal/hardcore nacional.

Após a apresentação cômica do Brutal Brega, a energia pesada surgiu palco Ice com Benediction, um dos grupos mais icônicos do cenário britânico de death/thrash metal old school.

Devido ao tempo limitado, a banda decidiu agradar os fãs com um repertório de faixas dos principais álbuns lançados durante os anos 90, incluindo músicas marcantes do disco Subconscious Terror. Em meio a batidas grinds, riffs power chords e guturais intensos, o vocalista Dave Ingram surpreendeu a plateia com sua simpatia, mandando elogios e interagindo com o público com piadas do tipo: “Agora são 13h e estou bebendo cerveja. Já tomei muita cerveja no café da manhã também. Espero que o dia tenha começado assim para vocês”.

Ao meu ver, Benediction aproveitou a chance para desfrutar do festival e decidiu mandar um set “despojado”, priorizando a oportunidade de se apresentar em um grande evento com uma postura mais relaxada em vez de fazer uma performance impecável e tecnicamente complexa. Mesmo com a banda exibindo uma postura mais descontraída, seus fiéis seguidores não demonstraram nenhuma insatisfação.



No Palco Sun, a banda Crypta, uma das mais aclamadas do cenário extremo atual, marcou oficialmente o seu retorno ao Brasil após uma turnê conturbada nos Estados Unidos com Morbid Angel.

Infelizmente, o show das meninas foi marcado por uma série de problemas técnicos que prejudicaram o desempenho da vocalista Fernanda. Desde a primeira música, ‘Death Arcana’, o som do seu microfone simplesmente ‘caiu’, retornando apenas próximo ao encerramento da música, o que resultou em reclamações acaloradas do público em direção aos técnicos de som. Além disso, em ‘Possessed’ e ‘Kali’, o volume de sua voz permaneceu baixo, e os técnicos precisaram entrar no palco para configurar os aparelhos, o que tomou um tempo precioso do set.

Apesar do início frustrante, as integrantes da banda mantiveram-se empenhadas e entregaram um set completo, tocando músicas do álbum ‘Echoes Of The Soul’, além do novo single ‘I Resign’.

A vocalista Fernanda estimulou o público a participar do show, incentivando mosh pits na pista. Tainá Bergamaschi e Jéssica di Falchi, nas guitarras, também se destacaram com performances sincronizadas. Mesmo com os problemas técnicos, o público pareceu apreciar a apresentação do Crypta, demonstrando apoio e entusiasmo ao longo do set.



Integrantes do Viper e Shaman prestaram homenagem ao lendário Andre Matos no palco Ice Stage, mas o início do show foi marcado por problemas técnicos recorrentes. Os chiados e falhas no microfone do vocalista Leandro Caçoilo atrapalharam a performance do grupo, resultando em uma apresentação catastrófica.

Contudo, os integrantes do Angra e Shaman conseguiram dar continuidade ao tributo, com as músicas ‘Lisbon‘ e ‘Make Believe‘. A presença de Luis Mariutti e Fábio Ribeiro no cenário trouxe ainda mais energia para as canções ‘Turn Away’, ‘For Tomorrow’ e ‘Fairy Tail’, todas de autoria do Shaman. Para encerrar o show, todos os músicos envolvidos no projeto se juntaram para interpretar a icônica faixa de abertura do primeiro álbum do Angra, ‘Carry On‘.

Infelizmente, a falta de efeitos especiais, arte ou fotografia em homenagem à obra do “Maestro do Metal” e as falhas técnicas constantes tornaram a experiência relativamente sem graça e até mesmo massacrante. Foi uma pena, pois a reunião de duas bandas tão importantes tinha tudo para ser um espetáculo emocionante.

No palco vizinho, o Summer Breeze recebeu sua primeira atração totalmente hard rock: nada menos do que Skid Row.

Desde o anúncio do festival em novembro do ano passado, o show da banda era considerado um dos mais aguardados de todo o evento. Afinal, o grupo agora tem o vocalista sueco Erik Grönwall (ex-H.E.A.T) como frontman, além de um excelente novo álbum no currículo: The Gang’s All Here, lançado em 2022.

O quinteto começou quebrando tudo com ‘Slave To The Grind’, permitindo que Erik demonstrasse imediatamente sua presença de palco matadora, saltando e correndo pelo palco. Em seguida, o repertório seguiu com um punhado de sucessos do “metal farofa”, como ’18 and life’, ‘Monkey Business’ e ‘Livin’ on a Chain Gang’, assim como as inéditas ‘Time Bomb’ e ‘The Gang’s All Here’, que foram muito bem recebidas.

Em sua estreia no Brasil, o novo vocalista interagiu bastante com os fãs, iniciando conversas em praticamente todos os intervalos. Em uma ocasião, Erik comentou que estava muito feliz por finalmente tocar no país, pois sempre ouviu falar que os brasileiros eram os mais fanáticos. A prova veio quando centenas de pessoas cantaram juntas ‘Youth Gone Wild‘, resultando no primeiro momento de euforia generalizada do dia.

O Skid Row fez uma apresentação que agradou tanto aos fãs fiéis como àqueles que não curtem tanto hard rock. Além de seus sucessos marcados por refrões pegajosos, a banda também apresentou algumas músicas mais pesadas, que combinaram muito bem com a atmosfera geral do evento.

Quem esperava um show do Sepultura com dezenas de música da “era Cavalera” saiu decepcionado: daquela fase, apenas ‘Territory’, ‘Propaganda’, ‘Refuse/Resist’, ‘Arise’ e ‘Ratamahatta’ estiveram presentes no repertório.

No entanto, como mencionado anteriormente, a apresentação foi frustrante apenas para quem queria ouvir canções da fase clássica. Com um repertório repleto de faixas recentes e brutais como ‘Isolation‘, ‘Means to An End’, ‘Kairos’ e ‘Guardians Of Earth’, a banda mostrou que está em sua melhor forma após uma série de lançamentos medianos.

A performance de Derrick Green foi inigualável em termos de brutalidade, enquanto Andreas Kisser provou mais uma vez por que é um dos maiores guitarristas do país, trazendo novas influências para seu estilo e executando os clássicos com perfeição. Mas o grande destaque foi a performance destruidora de Eloy Casagrande, adicionando uma dose avassaladora de peso e agilidade nas apresentações ao vivo do Sepultura. Entre as novidades, a estreia de ‘Ali‘ no set, com participação especial do DJ Babylons P.

É como nosso parceiro Igor Miranda mencionou em sua resenha: ‘[…]Reclamar do Sepultura atual é algo que, muito provavelmente, só é feito por quem nunca viu a banda ao vivo. Especialmente na fase atual, com Eloy Casagrande (bateria) acompanhando Derrick Green (voz), Andreas Kisser (guitarra) e Paulo Jr (baixo), o lendário grupo sempre oferece apresentações em alto nível – seja em um Sesc para algumas centenas de pessoas ou em um festival com milhares de presentes’.


Seguindo, veio mais uma dose de groove metal, desta vez com Lamb Of God, nada menos do que os maiores representantes globais do estilo.

A banda liderada pelo vocalista Randy Blythe foi a primeira atração do evento a trazer uma decoração de cenário mais caprichada, com tokens decorados com o logo do grupo e uma belíssima arte no telão de LED do palco Hot.

Com canções como ‘Memento Mori’ e ‘Ruin‘, os norte-americanos conseguiram colocar o público para abrir rodas gigantescas na pista do Memorial da América Latina. O caos total veio ainda no início do show com os riffs iniciais de ‘Walk With Me In Hell’, principal faixa do disco As the Palaces Burn, complementada por ‘Resurrection Man‘, música mais recente do álbum homônimo lançado em 2020.

O vocalista Randy impressionou com sua energia inigualável, pulando de um lado para o outro do palco enquanto gritava freneticamente. Em algumas ocasiões, o frontman saltou dos amplificadores, aumentando ainda mais o clima de insanidade.

Ele também arrancou palmas de seus seguidores ao “pedir desculpas” pela banda ter demorado sete anos para retornar ao Brasil. Além disso, Blythe comentou que era uma honra dividir o line up com o Sepultura, uma banda que ele admira há muito tempo. Após a fala, o guitarrista ainda mandou um pequeno medley com ‘Refuse/Resist’.

Para finalizar o show, a banda tocou uma dobradinha com dois hinos do groove metal: ‘Laid To Rest‘ e ‘Redneck‘. Durante as músicas, os fãs não conseguiram ficar parados e moshpits se formaram em diversos pontos do espaço. Alguns mais corajosos ainda resolveram arriscar crowd surfings, dando trabalho para a equipe de segurança.

O Lamb Of God conseguiu combinar uma presença de palco matadora, efeitos visuais marcantes e ótima interação com o público, fazendo do seu set um dos melhores de todo o festival.

No mesmo horário que o Stone Temple Pilots se apresentava no palco Ice Stage, o Accept subiu ao palco Sun para uma apresentação memorável. Centenas de fãs lotaram o espaço e a emblemática banda alemã mostrou que não vive apenas de sucessos passados ao iniciar o set com ‘Zombie Apocalypse’ e ‘Symphony of Pain’, faixas presentes em Too Mean to Die, disco lançado em 2021. 

Após apresentar as novidades, o grupo seguiu com uma sessão de canções que ajudaram a moldar o heavy metal e serviram como influência direta para grupos como Helloween e Scorpions, incluindo os clássicos ‘Breaker’, ‘Metal Heart’ e o hino ‘Balls To The Wall’.

Infelizmente, algumas falhas técnicas surgiram, mas mesmo assim, o Accept fez um show digno do palco principal.



Após mais de 11 horas de música extrema que abrangeu desde o death metal old school do Benediction até o metalcore moderno do Lamb Of God, o primeiro dia do Summer Breeze Brasil chegou ao seu final com o set do Blind Guardian, referência suprema do power metal.

Apesar da decoração simples em comparação com outras atrações que se apresentaram anteriormente, com apenas encartes de seus discos preenchendo o telão principal e um jogo de iluminação dramático, a banda entregou um espetáculo impecável.

Durante o set, que foi composto principalmente por músicas do álbum ‘Somewhere Far Beyond’, Hansi Kürsch estabeleceu uma conexão intensa com o público, incentivando o canto em coro, de forma diferente dos demais frontmen, que estimularam seus fãs a se digladiarem no moshpit.

Como resultado, a plateia se envolveu completamente com a performance do conjunto, cantando cada refrão e acompanhando a energia frenética da música.

Sem dúvida, ‘The Bard’s Song’ foi o ponto alto da apresentação, quando o vocalista entregou a voz à plateia. Além do álbum clássico reproduzido na íntegra, algumas novidades também foram destacadas, como o single ‘Violent Shadows’, presente em God Machine (2022).

No geral, o show do Blind Guardian no Summer Breeze foi uma experiência épica e inesquecível. Aqueles que tiveram a sorte de assistir ao vivo certamente se lembrarão desse espetáculo por muitos anos.

Quer saber como foi o segundo dia do Summer Breeze? Em breve, resenha completa no site!


Texto por Guilherme Góes
Fotos por Gustavo Diakov (xchicanox) – fotografo credenciado pelo site Igor Miranda, que gentilmente compartilhou seu trabalho com a Hedflow.

São Paulo recebe primeira edição do festival Summer Breeze

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- Estudou jornalismo na Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU). Apaixonado por música desde criança e participante do cenário musical independente paulistano desde 2009. Além da Hedflow, também costuma publicar trabalhos no Besouros.net, Sonoridade Underground, Igor Miranda, Heavy Metal Online, Roadie Crew e Metal no Papel.