No último sábado (16), a cidade de São Paulo viu sua agenda cultural repleta de shows e festivais. E, é claro, o punk rock, estilo que combina perfeitamente com a paisagem, estética e o caos da vida metropolitana, também marcou presença na na riquíssima programação com um de seus principais representantes: a humorada banda The Toy Dolls, que se apresentou no Carioca Club.
Fundado em 1979 na cidade de Sunderland, no norte da Inglaterra, durante o auge da explosão inicial do punk, o trio revolucionou o cenário ao apresentar uma alternativa inovadora. Com estética colorida, postura humorística no palco e letras repletas de sarcasmo, piadas e sátiras, o conjunto seguiu um caminho completamente contrário a nomes como Sex Pistols, The Exploited e Cock Sparrer, cujas músicas abordavam temas sociais, anarquismo e a vida cotidiana dos jovens ingleses menos privilegiados, além de shows marcados por episódios de violência.
Em mais de quatro décadas de atividade, o grupo já lançou 13 álbuns de estúdio, além de discos ao vivo, e realizou centenas de apresentações ao redor do mundo. Não perca a entrevista da Dani Melo com a banda para conhecer melhor o legado dos icônicos “Clown’s punks”.
Ao entrar na casa de espetáculos, imediatamente percebia-se que as expectativas estavam nas alturas. Cerca de 40 minutos antes do início do show da banda de abertura, a pista já estava lotada de fãs. Pessoas de diferentes gerações, desde aqueles que testemunharam o surgimento do punk em São Paulo até os mais jovens que estavam apenas começando a se envolver com a cena, exibiam seu amor pelo conjunto através de camisetas, bottons e patches chamativos.
A noite começou com a banda Skamoondongos, que iniciou sua performance dois minutos antes do previsto. O público foi imediatamente envolvido pelo cativante som do ska e ritmo “2 tones”, presentes em faixas como ‘Destrua o Fascismo’ e ‘Pobre Plebeu’.
Em um breve intervalo entre as músicas, o baterista Wellington compartilhou uma memória comovente: em 1998, com apenas 14 anos, ele teve a oportunidade de assistir ao Toy Dolls. Agora, quase 30 anos depois, expressou sua profunda honra em dividir o palco com seus ídolos. Para a alegria dos fãs, o grupo também apresentou novas músicas, incluindo ‘Ocupar e Resistir’, cuja composição aborda os protestos de junho de 2013, que desempenharam um papel importante na história recente do Brasil.
Skamoondongos também prestou uma tocante homenagem ao baixista Mingau com um cover de sua antiga banda, os Subtones. Recentemente, o músico foi vítima de um sério incidente, tendo sido baleado por uma gangue em Paraty, Rio de Janeiro.
No encerramento, o grupo presenteou a plateia com um cover da música ‘Medo’ da banda Cólera, seguido por uma releitura de ‘Bella Ciao’, um hino antifascista que foi cantado em uníssono por todos os presentes.
Foto: Jéssica Marinho
Já com a casa em sua capacidade máxima, os acordes inconfundíveis de ‘Hello’, de Lionel Richie, ecoaram pelos alto-falantes, sinalizando a tão esperada entrada do trio. A festa começou com uma empolgação contagiante ao som de ‘Fiery Jack’, com os fãs cantando o refrão a plenos pulmões, enquanto Michael Olga, o guitarrista, e Tommy Goober, o baixista, exibiam suas sincronizadas “dancinhas”. Em seguida, ‘Cloughy Is a Bootboy!’ manteve a energia alta com seus divertidos toques de apito, embora carregasse uma pegada voltada para o Oi/Street Punk.
A atmosfera descontraída continuou com ‘Bitten by a Bed Bug’, enquanto o calor infernal que dominava o recinto levou os membros da banda a tirarem seus coloridos ternos. Em ‘Fisticuffs in Frederick Street’, o público seguiu acompanhando o riff inicial com entusiasmo. Durante a execução desta faixa, destacou-se a incrível coordenação entre Olga e Tommy, resultado de mais de quatro décadas de amizade e colaboração musical.
Em ‘The Death of Barry the Roofer With Vertigo’, o baterista Mr. Duncan teve a oportunidade de brilhar ao assumir por um breve momento o papel de vocalista. No entanto, a verdadeira estrela da noite era Olga, que rapidamente retornou a sua posição para extrair o máximo de energia dos fãs com ‘Benny the Boxer’, ‘Up the Garden Path’ e ‘I’ve Got Asthma’.
O show também contou com certos elementos teatrais, como em ‘The Lambrusco Kid’, onde um “garçom” entregou um adereço de borracha semelhante a uma garrafa de champanhe, que no final foi usado para criar uma chuva de confetes. No entanto, o ponto alto da noite veio com o hit ‘Nellie the Elephant’, quando mais de 1600 pessoas entoaram em uníssono o icônico coro que marca o início do refrão da música.
Mesmo após a apresentação de um dos maiores clássicos do punk, o público permaneceu entusiasmado, aplaudindo com admiração as simplificadas versões punk rock de ‘Toccata and Fugue in D minor, BWV 565’ de Bach e ‘Wipe Out’, um cover dos The Surfaris e ‘Alec’s Gone’, que destaca uma sonoridade mais suave, quase como uma balada romântica que poderia facilmente entrar na trilha sonora de alguma novela.
No bis, o espetáculo foi marcado pela fusão do punk com elementos teatrais. Antes de iniciar o bloco, Olga distribuiu óculos para a plateia. Já em ‘Dig That Groove Baby’, a resposta dos seguidores foi uma roda punk frenética que tomou conta da pista. Para finalizar, uma chuva de bolas de plástico durante ‘Idle Gossip’ proporcionou uma experiência visual encantadora.
Toy Dolls provou que, mesmo após quatro décadas, sua música ainda é empolgante e extremamente agradável. Ao observar a energia do trio em cima do palco, era possível lembrar o porquê de nos apaixonarmos pelo punk rock – sua energia crua e sensação de comunidade que a cena fornece.
Mesmo sob um calor nauseante, uma noite inesquecível de música, diversão e camaradagem!
**Agradecimentos a todos e todas que colaboraram com a campanha de arrecadações promovida pelo projeto Solidariedade Vegan
Texto por Guilherme Góes
Fotos por Jéssica Marinho