Devido à pandemia de COVID-19, muitas bandas e artistas precisaram adiar shows comemorativos de datas especiais, e, infelizmente, a situação não foi diferente para a tradicional banda punk Ratos de Porão.
No ano de 2020, o mais importante nome do gênero na cena brasileira cancelou o show de retorno aos palcos do vocalista João Gordo – o polêmico e carismático músico e apresentador esteve ausente das atividades do grupo devido a complicações após um grave caso de pneumonia – , além de turnês no Brasil e apresentações em festivais no exterior.
No entanto, após quase dois anos, a espera acabou – e valeu muito a pena. De forma extremamente rápida e agressiva, a banda mostrou um set matador no palco da Iglesia (novo clube localizado no bairro de Pinheiros voltado ao público underground) marcado por músicas de seu primeiro álbum “Crucificados pelo sistema” (1981) em show especial de uma série comemorativa aos 40 anos de história do quarteto hardcore.
Por volta das 20h, o estacionamento da casa, bares e mercados das redondezas já estavam sendo tomados pelo público do evento. Em um ritmo de comemoração após um longo período marcado pelo distanciamento e várias restrições sociais, diversas figuras conhecidas da cena punk de São Paulo celebravam com os amigos na agitada Rua João Moura. Em uma quantidade menor, alguns fãs mais novos que jamais assistiram um show de rock ao vivo e que provavelmente começaram a cultivar interesse por música independente durante o período da pandemia também vieram para a cerimônia punk.
Dentro do clube, em conjunto com um estande destacando o merchandising exclusivo com novos itens especiais em comemoração aos 40 anos da banda, foi apresentada ao público uma discotecagem com bandas clássicas do punk rock mundial, entre elas: Stiff little fingers, Buzzcocks, The Damned e Dead Kennedys.
Já por volta das 22h20, os integrantes do Ratos de Porão subiram ao palco, e, como aguardado por todos os presentes no moshpit, iniciaram a apresentação com a tradicionalíssima “Morrer” – primeira música hardcore gravada oficialmente em disco no sul do continente americano. Em seguida, o set com complementado por outras canções do álbum, como “Caos”, “Guerra Desumana”, “Agressão/Repressão”, “Obrigado por obedecer” e “Asas da vingança”, variando entre comentários bem humorados do guitarrista Jão e do vocalista João Gordo entre os intervalos, relatando episódios de brigas que ocorreram durante a fase inicial do movimento punk brasileiro e conflitos pessoais recentes em relação à saúde do carismático líder do grupo.
Antes de iniciar a segunda parte da apresentação, Gordo dedicou a música “Que vergonha” ao vocalista Fabião, da pioneira banda Olho Seco, em referência às suas postagens nas redes sociais em defesa do presidente Jair Bolsonaro e comentários ofensivos em apoio ao episódio de violência contra o grupo humorístico “Porta dos fundos” no ano de 2019. Em seguida, o show continuou com as demais músicas do disco, entre elas: “Pobreza”, “F.M.I”, “Não me importo”, “Crucificados pelo sistema” e “Corrupção”.
Após uma breve pausa, o quarteto retornou ao palco, e João Gordo destacou que a banda está ensaiando constantemente após um breve período de inatividade e que possui diversas novidades para o ano de 2022, entre elas: lançamento de um disco novo, turnês e uma coletânea com paródias do grupo hardcore finlandês Terveet Kädet com letras criticando o governo de Jair Bolsonaro. Para não decepcionar os fãs que curtem outros trabalhos do Ratos de porão, o quarteto dedicou a última parte do show com os singles “Conflito violento”, “Testemunhas do apocalipse”, “Crocodila”, Cuando ci vuole ci vuole, além dos covers “Desemprego” (Fogo Cruzado) e Red Tape (Circle Jerks).
Comandada por um João Gordo completamente revigorado, extremamente politizado em relação ao período político atual e “mais simpático do que nunca”, o Ratos de Porão continua uma banda feroz e poderosa. O grupo entregou um set alucinado, e certamente supriu a sede de adrenalina de seus fervorosos fãs que estavam ansiosos pela experiência ímpar de um moshpit violento.
Sem dúvidas, o primeiro show da série comemorativa do Ratos de Porão foi uma excelente maneira de iniciar o retorno dos shows ao vivo da cena underground paulistana.
Confira o setlist da noite:
