Gojira e Mastodon provam ser monstros do metal contemporâneo em noite quente na capital paulista

Geralmente, no universo do rock, apenas bandas clássicas conseguem lotar arenas ou grandes casas de espetáculos e protagonizar espetáculos marcantes. Apesar das queixas frequentes de que ‘o rock está morto’ por parte de uma parcela significativa do público, o apoio ao variado leque de talentos contemporâneos é escasso, mesmo quando alguns nomes da cena atual apresentam trabalhos refinados e de qualidade excepcional. É como se o rock moderno estivesse preso no underground, destinado a celebrações modestas que, no máximo, preenchem clubes de porte médio.

No entanto, duas bandas que fogem do estereótipo clássico do rock estão liderando uma possível mudança nesse cenário ao redor da América Latina. Após encabeçarem o gigantesco ‘México Metal Fest’ na Cidade do México, Gojira e Mastodon atraíram centenas de headbangers para o Espaço Unimed, uma das maiores casas de shows da capital paulista, na última terça-feira (14), véspera de feriado, sob uma das temperaturas mais altas já registradas na cidade nos últimos 80 anos.

Sem nenhuma atração nacional programada para a abertura, o evento teve início com a performance dos americanos do Mastodon. Com antecedência de 2 minutos em relação ao horário oficial, Troy Sanders (baixo/vocal), Brent Hinds (guitarra/vocal), Bill Kelliher (guitarra), Brann Dailor (bateria) e o tecladista pernambucano João Nogueira subiram ao palco sob os gritos entusiasmados dos fãs entoando ‘Hey, Hey’. A introdução do set foi marcada por ‘Pain With an Anchor‘, a faixa de abertura do novo álbum ‘Hushed and Grim‘, cativando imediatamente a plateia com viradas de bateria complexas e um solo de guitarra impressionante. Em seguida, ‘Crystal Skull’ manteve a energia com o virtuosismo de Brent, apresentando mais uma sequência habilmente elaborada de riffs rápidos.



Na sequência, Troy saudou o público em português e introduziu ‘Megalodon‘, destacada por sua marcante intro de bateria e uma transição crossover, um traço característico da sonoridade única da banda, conhecida por suas explorações incomuns. Enquanto a música ecoava, um efeito visual de uma planta carnívora surgiu no telão de LED, complementando a experiência. Incorporações de ritmos incomuns dentro do metal continuaram em ‘Divinations‘, que contou com bases pré-gravadas de violão em ritmo country.

O Mastodon é reconhecido pelos videoclipes peculiares, muitas vezes integrando elementos de arte psicodélica. Ao vivo, essa estética única permanece presente. Enquanto as faixas eram executadas, um espetáculo visual à parte se desdobrava, com efeitos especiais que exibiam imagens sinistras, transformando o show em uma experiência tanto visual quanto sonora. Destacaram-se ‘Sultan’s Curse’, cujo cenário incorporou fortes referências à cultura mexicana e à tradicional festa do ‘Dia de Los Muertos’; ‘Halloween‘, com um incrível trabalho no estilo cartoon; e ‘Black Tongue‘, cujo cenário remetia aos antigos planos de fundo do Windows Media Player, evocando sentimentos nostálgicos especialmente entre os espectadores com idades entre 30 e 40 anos, que provavelmente descobriram o trabalho da banda por meio de downloads em softwares P2P durante meados da década de 2000.


Na reta final, veio uma sequência com ‘Mother Punch‘ do primeiro álbum ‘Remission‘, ‘Steambreather‘, marcante por seu ritmo mais sereno, e o megahit ‘Blood and Thunder‘, faixa que impulsionou a popularidade da banda ao ser incluída no jogo ‘Need For Speed: Most Wanted‘. Nesse momento, o público não se conteve e deu início ao moshpit mais enérgico do set. Ao final da apresentação visceral, os membros do conjunto distribuíram palhetas e baquetas, prometendo um retorno mais breve ao Brasil, garantindo não fazer os fãs esperarem mais oito anos. Foi um grande show, não apenas pela qualidade sonora, mas também pela incrível decoração psicodélica e pela versatilidade dos integrantes do grupo, cada um contribuindo com participações precisas nos vocais em momentos distintos.

Setlist

Pain With an Anchor

Crystal Skull

Megalodon

Divinations

Sultan’s Curse

Bladecatcher

Black Tongue

The Czar

Halloween

High Road

More Than I Could Chew

Bis:

Mother Puncher

Steambreather

Blood and Thunder

Fotos (Stephan Solon – Assessoria Midiorama)



Após uma breve pausa para a troca de instrumentos, as luzes do palco se apagaram e um contador regressivo de 180 segundos surgiu no telão principal do clube. Nos últimos 30 segundos, o baterista Mario Duplantier assumiu sua posição, começando a criar uma série de viradas furiosas. Quando faltavam apenas 10 segundos, Joe Duplantier (vocal/guitarra), Christian Abreu (guitarra) e Jean Michel Labadie (baixo) surgiram repentinamente e deram início à intensa ‘Born For One Thing‘, incitando o público a formar uma roda na pista. A energia desencadeada pela abertura agressiva continuou em alta com ‘Backbone‘, enquanto os fãs vibraram ao som das guitarras perfeitamente sincronizadas e à explosão de blasts beats liderados por Mario.

Logo em seguida, Joe iniciou os riffs ‘raspados’ inconfundíveis de ‘Stranded‘, arrancando gritos de seus seguidores. A escolha de executar o maior hit do Gojira logo no início foi considerada um tanto polêmica por muitos, já que poderia ter sido reservado para um ponto mais estratégico do setlist. Depois, ‘Flying Whales’ trouxe breakdowns pesados, mas ainda assim mantendo uma sonoridade acessível e envolvente. Neste momento, belos efeitos visuais em 3D retratando baleias, em referência à arte de ‘From Mars to Sirius’, enfeitaram a apresentação. A cenografia também se destacou em ‘The Cell‘, com imagens realistas de relâmpagos que tiravam o fôlego, além de explosões de máquinas de fumaça sincronizadas com o ritmo da música.



Lamentavelmente, houve uma falha na produção devido ao excesso de fumaça e à intensidade extrema da iluminação. A partir da metade do show, tornou-se praticamente impossível visualizar os integrantes no palco. Em faixas como ‘The Art Of Dying’, ‘Grind’ e durante o solo de bateria de Mario, apenas se ouvia o som em certos pontos do clube. Contudo, em ‘Another World’, a situação se normalizou, com a bela iluminação dos telões preenchendo o espaço com o videoclipe em estilo cartoon. Outro ponto negativo foi a ausência de posicionamento político por parte dos franceses, algo pelo qual o Gojira é conhecido, já que frequentemente aborda temas polêmicos e de relevância global. No entanto, durante o show no Brasil, optaram por evitar essa postura, exceção feita em ‘Amazonia‘, onde efeitos de chamas dominaram o palco, em crítica ao desgoverno ambiental liderado por Jair Bolsonaro em sua gestão. Como de costume, após ‘The Gift Of Guilt’, Mario embarcou em uma boia inflável e ‘navegou’ sobre ‘ondas humanas’, criando um momento marcante de interação entre público e artista.

A Mega Monsters Tour trouxe à tona o melhor do rock contemporâneo: uma fusão de boa música, efeitos impactantes e uma conexão visceral com o público. Foi uma demonstração explícita de que nomes atuais não só conseguem rivalizar com grupos clássicos, mas também inovar e elevar a experiência musical a patamares excepcionais.

Setlist

Born for One Thing

Backbone

Stranded

Flying Whales

The Cell

The Art of Dying

Drum Solo

Grind

Another World

Oroborus

Silvera

The Chant

L’enfant sauvage

Bis:

The Heaviest Matter of the Universe

Amazonia

The Gift of Guilt

Fotos: Stephan Solon (Assessoria Midiorama)

Gojira e Mastodon provam ser monstros do metal contemporâneo em noite quente na capital paulista

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- Estudou jornalismo na Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU). Apaixonado por música desde criança e participante do cenário musical independente paulistano desde 2009. Além da Hedflow, também costuma publicar trabalhos no Besouros.net, Sonoridade Underground, Igor Miranda, Heavy Metal Online, Roadie Crew e Metal no Papel.